Por: Dra. Flávia Esper – Neurologista do Instituto de Psiquiatria Paulista
É muito comum na rotina de consultório do neurologista que se encontre na seguinte situação, pacientes jovens que comparecem para atendimento com queixas de esquecimento e que se dizem muito preocupados com a possibilidade de que seja “Alzheimer precoce”.
Desta forma, é preciso que tenhamos uma rotina de avaliação destes casos de queixa cognitiva e/ou memória, pois podemos estar diante de um quadro de demência potencialmente reversível, e como o nome bem diz, podem ser curadas efetivamente desde que prontamente identificadas e tratadas corretamente. Estes pacientes podem ter doenças sistêmicas que estejam corroborando para o quadro ou mesmo que sejam a causa básica dele.
Diagnóstico
A primeira etapa do diagnóstico de demência potencialmente reversível é a realização de uma boa anamnese: a entrevista que o médico faz com o paciente a fim de esclarecer sobre seus sintomas e sua história clínica, bem como de seus familiares. Neste momento é perguntado sobre o tipo de acometimento clínico interpretado pelo paciente como falta de memória – se há impacto em atividades do dia a dia e no caso de haver acompanhante na consulta, qual, a percepção dele em relação a estas queixas. Como está o humor do paciente, seu padrão de sono e se apresenta quadros de dores crônicas. É avaliado o histórico de uso de medicações. uso de substâncias lícitas, como o álcool, ou ilícitas, internações prévias e, história familiar de demências. Medicamentos com efeito anticolinérgico ou hipnóticos podem causar comprometimento da atenção e da memória que são reversíveis com sua suspensão.
Em seguida, é realizado o exame neurológico completo, incluindo teste de rastreio neuropsicológico, como o mini exame do estado mental, para que seja avaliada possibilidade de alguma lesão objetiva no Sistema Nervoso, além da queixa do paciente.
A depender do que é encontrado nestas duas etapas podemos elaborar uma lista de exames a serem solicitados ao paciente para esclarecimento diagnóstico.
Exames
Testes laboratoriais
- Hemograma completo
- Provas de função renal, hepática e tireoidiana
- Dosagens de vitaminas, como a vitamina B12 e o ácido fólico
- Além de pesquisa de doenças infecciosas como sífilis e AIDS.
Pode ainda ser necessário realização de exame de neuroimagem, como tomografia ou ressonância de crânio.
Tipos de declínio cognitivo
Tipos de declínio cognitivo que se mesclam dentro do grupo das demências potencialmente reversíveis podem incluir:
- Quadros depressivos.
- Delirium, que é basicamente uma síndrome confusional aguda, e será provavelmente mais vista em ambiente de hospitalar, em unidades de pronto-atendimento.
- Demências crônicas e lentamente progressivas, como se observa nas causas degenerativas e as rapidamente progressivas, esta classificação mais relacionada com a progressão para estágios moderados a graves de demência.
Na USP foram conduzidos 2 estudos separados por um períodos de tempo de 10 anos, em que foi verificada frequência de demências potencialmente reversível de 8%, nas duas ocasiões. Estudo no interior de São Paulo, em Catanduva, mostrou frequência de 6,8%, e as causas incluem baixos níveis de vitamina B12 e hipotireoidismo. Em um estudo publicado em 2003 as causas de demência potencialmente reversíveis foram: neurossífilis (nove), hidrocefalia (cinco), demência alcoólica (três), hematoma subdural (um) e doença de Wilson (um).
Principais causas de demências potencialmente reversíveis
São causas mais frequentes de demências potencialmente reversíveis:
- Hipotireodismo/hipertireoidismo
- Estados carenciais
- Infecções – neurossífilis, neuroAIDS
- Tumores benignos do sistema nervoso
- Hidrocefalia
- Hematoma subdural
- Efeitos colaterais de psicofármacos e outros medicamentos
- Doenças imunomediadas
Devemos sempre lembrar que cerca de um terço dos casos de demência pode ser atribuído a sete fatores de risco potencialmente modificáveis: inatividade física, tabagismo, hipertensão arterial, obesidade, diabetes, depressão e baixo nível educacional.
Se você “anda esquecendo muito”, procure o seu médico
As demências eram consideradas de mau prognóstico até há aproximadamente 10 anos. Geralmente imaginava-se tratar de doenças com evolução atípica, e por isso de difícil diagnóstico e manejo, ou a doença de Creutzfeldt-Jakob – protótipo das doenças priônicas.
Isso não é mais uma verdade, já que muitas delas são abordadas como reversíveis quando diagnosticadas e tratadas corretamente, podendo, inclusive, ter melhor prognóstico que as lentamente progressivas.
O mesmo racional de investigação pode ser pensado no caso de pacientes com quadros de demências degenerativas como a demência na doença de Alzheimer ou na doença de Parkinson, no qual a identificação destas condições pode aliviar sintomas, sem realmente reverter a demência.
Portanto, se você sente que anda esquecendo demais, ou conhece alguém que esteja passando por isso, não exite em procurar ajuda o quanto antes para obter o correto diagnóstico.